Errantry vs Single Root
Glissant differentiates errantry from the single root, which symbolizes fixed identity and exclusion. In circular nomadism, there is a return to the point of origin without deep attachment, while in arrow nomadism, there is displacement with a defined goal, without cultural mixing. Neither manifests the root because they do not create total rooting. Arrow nomadism maintains a separate identity, without opening up to the other. On the other hand, errantry breaks with the fixed origin and destiny, promoting encounters and exchanges.
The Ship and the Three Abysses
Glissant uses the ship as a symbol of the forced crossing of enslaved African peoples across the Atlantic. It represents displacement, errantry, and the creation of new identities. He also presents three abysses: the first is the ocean, where countless lives were lost; the second, the cultural destruction in the enslaved plantations; and the third, the oblivion imposed by colonial history. However, the abyss does not only signify loss, but also reinvention. Errantry transforms this void into a space of creation, where the diaspora gives rise to new relationships and identities in constant transformation.
Os Lusíadas in Poetics of Relation
While Os Lusíadas is about anchoring Portuguese identity (and economic power) through conquest (through the creation of myth, and consequential legitimization), Glissant’s errantry suggests a more fluid, non-hierarchical relationship with space, culture, and identity. The Portuguese takes an approach of massive arrow nomadism, as it is not fully rooted in the idea of Portugal, nor is open to mix with other cultures. They have a defined goal: trade, and a pride attached to it.
Foundational texts like the Iliad, Odyssey, Eneid, and Sagas are books of exile rather than fixed national certainties. Os Lusíadas follows the same pattern: it tells the story of an errant journey across the seas within this epic past, in which the Portuguese empire is not yet fully realised but is imagined through narratives of travel, movement, exile, and expansion into unknown lands, but at the same time it tries to root Portuguese identity and be its foundation. In fact, the book itself talks about the fragility of empire at the time.
The root is mono linguistic, it produces a hegemony of language that tries to eliminate the “impurity” of other languages that thrived from the Relation to the Other. For example, slang in Portuguese are words coming from Other languages, such as Kimubundu (bue, bora, bazar, …).
Citations
De errância à raíz ocidental “Na época dos nomadismos invasores, a paixão de se definir adquire a feição da aventura pessoal. Ao longo dos seus périplos, os conquistadores constituem impérios que se desmoronam com eles na morte. As suas capitais deslocam-se com eles. «Roma não está em Roma, está sempre onde eu estou.» Não é a raiz que importa, mas sim o movimento. O pensamento da errância não se detém, travado pela realidade intensa desse nomadismo demasiado funcional, cujos fins nunca teria podido conhecer. Centro e periferias equivalem-se. Os conquistadores são a raiz móvel e efêmera dos seus povos. É pois aí, no Ocidente, que o movimento se torna fixo e que as nações se pronunciam até se repercutirem no mundo. Essa fixação, esse enunciado e essa expansão requerem então que a ideia de raiz ganhe pouco a pouco esse sentido intolerante que Deleuze e Guattari certamente pretenderam recusar. Se regressarmos a esse episódio ocidental, é precisamente porque ele proliferou pelo mundo. O modelo propagou-se. A maior parte das nações que se libertaram do colonialismo tenderam a formar-se em torno da ideia de poderio, pulsão totalitária da raiz única, e não de uma relação fundadora com o Outro. O pensamento cultural de si eriça-se, opondo o cidadão ao bárbaro. Não houve nada mais absolutamente oposto ao pensamento da errância do que esse período da história das humanidades em que as nações ocidentais se constituíram e que depois se repercutiram no mundo. (…) Ao mesmo tempo, a realidade do exílio é sentida como uma falta (temporária), sendo interessante notar que ela dirá, antes de mais, respeito à língua. (…) No Ocidente, as nações constituíram-se sobre o modo da intransigência linguística, (…) A raíz é monolingue.” (p.24)
Livros fundadores de nações “Contudo, e isso é um imenso paradoxo, os livros fundadores da comunidade, o Antigo Testamento, a Ilíada, a Odisseia, as Canções de Gesta, as Sagas, a Eneida ou as epopeias africanas são livros de exílio e, muitas vezes, de errância. Essa literatura épica é espantosamente profética: diz a comunidade, mas através da relação de seu fracasso aparente ou, em todo o caso, da sua superação, e a raiz é, consequentemente, considerada como tentação (desejo de contrariar a raiz) e quase sempre sentida nos factos. Os livros coletivos do sagrado ou da historicidade contêm em si o exato contrário das suas turbulentas pretensões. Neles, a legitimidade da posse de um território, sempre mitigada pela relativização da própria noção de território. Livros de despertar para a consciência coletiva, eles instituem um índice de mal-estar e de angústia que permite ao indivíduo recentrar-se, sempre que este constitui um problema para si mesmo. A vitória dos gregos na Ilíada depende de um embuste, Ulisses, ao regressar da sua Odisseia, é apenas reconhecido pelo seu cão, o David do Antigo Testamento é desonrado pelo adultério e pelo homicídio, a Canção de Rolando é a crônica de uma derrota, as personagens das Sagas estão marcadas pelo signo de uma fatalidade incontornável, e assim por diante. Esses livros fundam algo de muito distinto de uma certeza absoluta, dogmática ou totalitária (independentemente da utilização religiosa que deles será feita): são livros de errância, para além da procura ou do triunfo do enraizamento que o movimento da História exige. Hegel mostra, no Hegel’s Lectures on Aesthetics, como as obras fundadoras de comunidades surgem, de modo espontâneo, no momento em que a consciência ingênua se assegura da sua legitimidade – sejamos claros: do seu direito à posse de um território. Nesse sentido, o pensamento épico está muito próximo do mito. (p.25) (…) abordei esta dimensão de uma literatura épica, interrogando-me se nos dias de hoje não nos seriam ainda necessárias obras fundadoras que se baseassem numa semelhante dialética do desvio: afirmando, por exemplo, o rigor político, mas também o rizoma da relação múltipla com o Outro, e fundando as razões de viver de qualquer comunidade numa forma moderna do sagrado, que seria, em suma, uma poética da Relação.”
Turism “daqueles que suportam a injustiça do mundo. A sua errância é, com efeito, imóvel. Não viveram o luxo do afastamento, melancólico e extrovertido. Não viajam. Mas para eles o saber da raiz passa agora a ser-lhes dado pela intuição da Relação: é essa uma das constantes do nosso mundo. Viajar já não é o lugar de um poder, mas o momento de um prazer, se bem que privilegiado. A obsessão ontológica do conhecimento dá lugar à fruição de uma relação, de que _o turismo é a forma elementar e, a maior parte das vezes, caricatural. Os que ficam sobressaem-se com essa paixão do mundo, comum a todos. Acontece-lhes sofrer os tormentos do exílio interior. (…) Falo desse exílio interior que atinge os indivíduos, quando as soluções não são, ou não são ainda, no que toca às relações de uma comunidade com o seu meio, por ela globalmente consentidas. (p.28)“
Collected text for collage
O BARULHAMENTO DO MUNDO (José António Fernandes Dias, AFRICA.CONT)
como ser um eu mesmo sem sufocar o outro e como abrir-se ao outro sem asfixiar o eu mesmo
e, entre nós, vive-se privilegiadamente na paróquia lusófona
correntes como um arquipélago
de pensamento arquipelágico
uma forma de pensamento mais intuitivo, mais frágil, exposto mas também disposto ao caos do mundo
um arquipélago interpretativo cujos Mares pretende continuar a navegar
embarcaram connosco nesta viagem sem hesitação
nos arquipélagos de morte evidente
IMAGINÁRIO
Pensar o pensamento equivale quase sempre a retirarmo-nos para um lugar sem dimensão
o pensamento espaça-se realmente no mundo. Informa o imaginário dos povos, as suas poéticas diversificadas
A cultura é a precaução daqueles que inspiram a pensar o pensamento mas se mantêm afastados do seu caótico percurso
O pensamento desenha o imaginário do passado: um saber em construção. Ele é partilha, de que ninguém pode abdicar, nem, nele se detendo, dela se valer.
CAPÍTULO I - ABORDAGENS
A BARCA ABERTA
Aquilo que petrifica, nas experiência da deportação dos africanos para as Américas, é sem dúvida o desconhecido enfrentado sem preparação nem desafio.
A primeira treva foi o ser arrancado à terra quotidiana, aos Deuses protetores, à comunidade tubular. A segunda noite foi de torturas, degenerescência do ser, provocado por tantos incríveis sofrimentos. Imaginem 200 pessoas amontoadas num espaço que mal poderia conter um terço delas. Imaginem o vómito, a carne viva, piolhos pululantes, os mortos jacentes, os agonizantes apodrecendo. Imaginem, se forem capazes, embriaguez vermelha das subidas ao convés, a rampa que é preciso subir, o sol negro no horizonte, a vertigem, esse deslumbramento do céu colado às ondas. Vinte, trintra milhões de deportados durante dois séculos o mais. A degradação, mais sempiterna que um apocalipse.
Esse animal tem o aspecto de uma fibrila.
É o choque mais totalmente conhecido entre os poderes dos escritos e os impulsos da oralidade. No barco negreiro, o único escrito é o livro de contabilidade que diz respeito ao valor de troca dos escravos. No espaço do barco, o grito dos deportados é abafado, como será no universo das Plantações. Este choque ecoa até nós.
Aterrador é o abismo, três vezes ligado ao desconhecido.O primeiro é um terror inaugural, quando mergulhas no ventre da barca. Uma barca, segundo a tua poética, não tem ventre, uma barca não engole, não devora, uma barca pilota-se a céu aberto. O ventre dessa barca dissolve-te, precipita-te num não mundo onde gritas. Essa barca é uma matriz, poço-matriz. Geradora do teu brado. Produtora também de toda a unanimidade por vir. Porque se estás só nesse sofrimento, partilhas o desconhecido com alguns, que ainda não conheces. Essa barca é a tua matriz, um molde, que, no entanto, te expulsa. Grávida tanto de mortos como de vivos condenados a uma morte adiada.
O segundo abismo é o abismo do mar. Quando a Marinha dá caça ao negreiro, o mais simples é aligeirar a barca, lançando ao mar a carga, com um lastro de grilhetas. São os sinais de pista submarinos, do golfo da Guiné às Ilhas de Sotavento. Assim, toda a navegação no esplendor verde do oceano — a melancolia das travessias em transatlântico, a glória das regatas desportivas, a tradição das corridas de canoas ou de pagaias — sugere, com uma evidência de algas, esses abismos, essas profundezas, pontuados de grilhetas enferrujadas. O abismo é verdadeiramente uma tautologia, todo o oceano, todo o mar, por fim afagado com doçura pelos prazeres da praia, é um enorme começo, só ritmado por essas grilhetas cobertas de verdete.
Mas, para que essas costas ganhem forma, e antes que possam ser concebíveis, ou sequer visíveis, quantos tormentos desconhecidos! A face mais petrificante do abismo encontra-se de facto diante da proa do navio negreiro, rumor pálido que tanto pode ser nuvem de tempestade, chuva ou morrinha, como fumo de uma fogueira tranquilizadora. De ambos os lados da barca desaparecem as margens do rio. Que rio é este, então, sem meio? Apenas com um em-frente? Não vogará essa barca pela eternidade, nos confins de um não mundo, que nenhum Antepassado frequenta?
A terceira forma do abismo projeta assim, em paralelo com a massa de água, a imagem invertida de tudo o que foi abandonado.
e que, para muitas gerações, só será encontrado nas savanas azuis da memória ou do imaginário, cada vez mais tênues.
Essa ascese de atravessar assim a terra-mar que não se sabe ser o planeta-terra, sentindo desvanecer-se não só o uso da palavra dos deuses, mas também a imagem próxima do objeto mais quotidiano, do animal mais familiar. O gosto evanescente da comida, o ch eiro persistente da terra ocre e das savanas.
«Eu te saúdo, velho Oceano!» Tu guardas nas tuas cristas o barco secreto dos nossos nascimentos, os teus abismos não o nosso próprio inconsciente, povoados de fugidias memórias. Depois decessas nessas novas costas, onde nós depomos as nossas chagas estriadas de alcatrão, as nossas bocas ensanguentadas e os nossos gritos silenciados.
A experiência do abismo está no abismo e fora dele. Tormento daqueles que nunca saíram do abismo: que passaram diretamente do ventre do navio negreiro para o ventre violeta dos fundos do mar. Mas: a loucura provou-nos a nossa, vivificou-nos o nosso não-sentido. O pânico não vale, a saudade é tardia. Aprendemos, por fim: na aliança com a terra imposta, sabida à medida, e a dor não sabida do abismo serviu de lodo para essas metamorfoses. Os povos que então se constituíram, mesmo que tivessem esquecido o abismo, mesmo que não conseguíssemos imaginar o tormento daqueles que ali pereceram, não deixaram de tecer uma vela (um véu) com a qual, não regressando à Terra-Anterior, se ergueram nesta terra aqui, súbita e estupefacta. Encontraram nela os primeiros ocupantes, também eles deportados por um saque imóvel. Ou então adivinharam apenas os seus vestígios devastados. Terra do além tornada terra em si. E essa vela desconhecida, que por fim se desfralda, é irrigada pelo vento branco do abismo. E assim o desconhecido-absoluto, que era a projeção do abismo, e que transportava eternamente o abismo-matriz e o abismo infinito, tornou-se por fim conhecimento.
Não só conhecimento particular, apetite, sofrimento e fruição de um povo particular, não só isso, mas o conhecimento do Todo,
Os povos experimentaram o abismo não se vangloriam de ter sido eleitos. Não julgam ter dado origem ao poder da modernidade.
que desbravam a medida que adquirem o esquecimento do abismo e que a sua memória se consolida
Vítima original flutuando sobre os abismos do mar, uma exceção, ela tornou-se comum para fazer de nós, os descendentes, um povo entre outros.
Tomamos partido por esse jogo do mundo, pelas Índias renovadas em direção às quais gritamos, por essa Relação de tempestades e de calamarias profundas onde possamos honrar as nossas barcas.
É isso que nos faz insistir na poesia. Apesar de consentirmos em toda a irrecusável tecnologia, apesar de concebemos as manobras das políticas a concertar, o horror de vencer fomes e ignorâncias, torturas e massacres, e a totalidade do saber a conquistar, o peso de cada maquinária que acabaremos por controlar, e a fulguração desgastante da passagem de uma a outra era, da floresta à cidade, do conto ao computador - há, à proa, agora, esse ainda rumor, nuvem ou chuva, ou fumo tranquilo. Conhecemo-nos enquanto multidão, no desconhecido que não aterroriza. Gritamos o grito da poesia. As nossas barcas estão abertas, nelas navegamos para todos.
A ERRÂNCIA, O EXÍLIO
A raiz é única, é uma origem que de tudo se apodera e que mata o que está a volta; opõem-lhe o rizoma, que é uma raiz desmultiplicada, que se estende em rede pela terra ou no ar, sem que nenhuma origem intervenha como predador irremediável.
em que nem a audácia nem agressão intervêm.
Oponhamos-lhe o nomadismo invasor, o dos hunos, por exemplo, ou o dos Conquistadores, que tem como objetivo conquistar terras através dos extermínio dos seus ocupantes. Este nomadismo não é prudente nem circular, não mede os seus efeitos, é um salto absoluto em frente: um nomadismo em flecha.
A relação com a terra é demasiado imediata, ou predadora para que a preocupação de identidade a ela esteja ligada só. A identidade adquirir-se-á quando as comunidades tiverem tentado, através do mito ou da palavra revelada, legitimar o seu direito a essa posse de um território.
Nessa época, a identificação faz-se com uma cultura - que é Concebida como civilização e não ainda como uma nação.
Na época dos nomadismos invasores, a paixão de se definir adquire a feição da aventura pessoal. Ao longo dos seus périplos, os conquistadores constituem impérios que se desmoronam com eles na morte. As suas capitais deslocam-se com eles. «Roma não está em Roma, está sempre onde eu estou.» Não é a raiz que importa, mas sim o movimento.
Centro e periferias equivalem-se. Os conquistadores são a raiz móvel e efêmera dos seus povos.
que a ideia de raiz ganhe pouco a pouco esse sentido intolerante
A maior parte das nações que se libertaram do colonialismo tenderam a formar-se em torno da ideia de poderio, pulsão totalitária da raiz única
opondo o cidadão ao bárbaro
as nações ocidentais se constituíram e que depois se repercutiram no mundo
Esse pensamento da errância, que ia a contracorrente da expansão nacionalista, transforma-se então «em» aventuras muito pessoais
Ao mesmo tempo, a realidade do exílio é sentida como uma falta (temporária), sendo interessante notar que ela dirá, antes de mais, respeito à língua.
e o exilado confessa de bom grado que aquilo que mais o afeta é a impossibilidade de comunicar na sua língua.
A raíz é monolingue.
Contudo, e isso é um imenso paradoxo, os livros fundadores da comunidade, o Antigo Testamento, a Ilíada, a Odisseia, as Canções de Gesta, as Sagas, a Eneida ou as epopeias africanas são livros de exílio e, muitas vezes, de errância.
obrigando os povos visitados ou conquistados à longa e dolorosa busca de uma identidade que deverá sobretudo opor-se às desnaturações provocadas pelo conquistador
Variante trágica da procura de identidade.
É bem a imagem do rizoma, que nos faz reconhecer que a identidade não está só na raiz, mas também na Relação
Não nos cansamos de repetir que o que este exportava em primeiro lugar era sua língua. Por isso as línguas do Ocidente eram consideradas veiculares e faziam as vezes de metrópoles.
o dito da Relação é multilingue
A obsessão ontológica do conhecimento dá lugar à fruição de uma relação, de que o turismo é a forma elementar e, a maior parte das vezes, caricatural.
O exílio interior é a viagem para fora dessa prisão.
A maior parte das vezes, distrai-se em compensações parciais de prazer, em que o indivíduo se consome. O exílio interior predispõe ao conforto das coisas, que não distrai da angústia.
o errante, que já não é o viajante, nem o descobridor, nem o conquistador, procura conhecer a totalidade do mundo e sabe já que nunca conseguirá fazê-lo - e que é aí que reside a beleza ameaçada do mundo
Mergulha nas opacidades
O pensamento a errância concebe a totalidade, mas renuncia de bom grado à pretensão de a comandar ou de a possuir.
o pensamento da errância é postulação dos sagrado que nunca se revela e que nunca se apaga.
sem que seja necessário que eu as isole num Panteão que elas recusariam.
Obra que convida à totalidade - até à exaltação irredutível de um universal que se esgota, de tanto ser dito.
POÉTICAS
Tudo se passa como se, no momento de entrar numa poética da Relação mundial, que viria substituir a antiga hegemonia, o pensamento coletivo que se exerce na língua optasse por ocultar o seu contato com o outro, em vez de aceitar uma participação
Fingiu-se esquecer que um
tanto aqui como no resto do mundo, por esse trabalho através do qual as culturas dos homens se identificam umas com as outras, para, a partir de então, se transformarem mutuamente.
Extensão vertiginosa, não sobre o mundo, mas em direção aos abismos que o homem transporta dentro de si.
o homem ocidental, que nesse momento rege o ritmo e movimento da modernidade.
O espaço interior é tão infinito para ser explorado como os espaços terrestres. Ao mesmo tempo que descobre as múltiplas variedades da espécie de que constitui, o homem sente que a pretensa fixidez do conhecimento é um logro, e que só saberá de si mesmo aquilo que o saber aos outros.
Essa beatitude romântica é varrida pelo odor pútrido
Ela sanciona o momento em que a língua, como que satisfeita com a sua perfeição, deixa de ter como objeto a narrativa da sua ligação com o meio circundante para se concentrar no único desejo de ultrapassar os seus limites
Não se tratará de descobrir nem de contar o mundo, mas de produzir um equivalente dele que será o Livro, onde tudo será dito, sem que nada seja relatado.
O mundo como livro, o livro como mundo.
O criador de texto apaga-se, ou melhor: abdica para se revelar na textura daquilo que criou. Tal como a narrativa fora banida da poética de Mallarmé, a História (no sentido que o Ocidente deu a essa palavra) é relativizada na opinião estruturalista.
descobridores que foram os exploradores, os mercadores, os conquistadores, os etnólogos, os homens de espírito, de fé e de lei vindos do Ocidente.
para esboçar aos olhos dos exegetas a problemática
Mas veremos que o verbo “compreender”tem, porventura, aqui um temível sentido repressivo
Sabemos que o outro está em nós, que ele ressoa não só no nosso futuro mas também em grande parte das nossas concessões e no movimento da nossa sensibilidade.
Porque, se o mundo não é um livro, não é menos de verdade que o silêncio do mundo nos conduziria, por seu turno, à surdez.
A Relação que agita as humanidades, necessita da palavra para se editar, para se continuar.
Mas será necessário citar todos aqueles que viveram desde então, em registos apaixonados, críticos ou possessos, racistas ou idealistas, excessivos ou racionais, o apelo do Diverso?
Poetas, que nasceram ou viveram no alhures, sonham a origem do seu imaginário e, conscientemente ou não, “fazem a viagem em sentido contrário”.
A palavra do poeta conduz da periferia à periferia, reproduz o vestígio
que ela transforma toda a periferia em centro, e, mas ainda, que ela é abole a própria noção de centro e de periferia,
explode, qual trama escrita na totalidade suficiente do mundo
o encontro com o Outro
A capacidade de sentir o choque do alhures
O Diverso, a totalidade quantificável de todas as diferenças possíveis, é o motor da energia universal que há que preservar das assimilações
dos hábitos padronizados.
fixar na memória o cenário da sua ilha natal
vai em direção ao outro, corre para o alhures
tentarão sempre erguer catedrais eloquentes
As histórias, convergentes, encontraram assim essa parte das literaturas do mundo, fazendo nascer novas expressões “dentro” da mesma língua.
O velho espaço de trajetória, a espiritualidade do itinerário cede o lugar à compacticidade realizada
os emaranhados da Relação
tudo o que foi dito foi-o de maneira fragmentária, reticente, obstinadamente cega
repugna consagrar essa abolição, torpedear assim os seus bastiões.
Usa de astúcia durante os avanços do mundo, furta-se a eles.
Inventa biombos.
que visa o fundamental e a base, que aparenta ao verdadeiro, furta-se a esses caminhos incertos.
A paisagem de tua palavra é a paisagem do mundo. Mas a sua Fronteira está aberta.
Não só um encontro, um choque, uma mestiçagem, mas também uma dimensão inédita que permite a cada um estar ali e em outro lugar, enraizado e aberto pedido na montanha e livre no mar, em acordo e em errância.
O seu símbolo mais evidente é a língua crioula, cujo génio consiste em abrir-se sempre, ou seja, em só se fixar segundo sistemas de variáveis que teremos tanto de imaginar como de definir.
A criolização conduz-nos assim à aventura do multilinguismo e à explosão inaudita das culturas.
diluição mútua
Trata-se da marca violenta da sua partilha com sentido, não importa.
UMA ERRÂNCIA ENRAIZADA
que não é no lugar do seu primeiro grito
um aqui (a Europa) em direção ao qual é necessário chegar por opção
de origens nobres
análise elementar e grosseiro
E poderíamos adiantar mais ainda, imaginando feridas sob o verniz formal, um drama que se esconde e se transforma em orgulhosa altivez. Não o façamos. A lição do poeta vai mais fundo. Abandona as paragens habituais que a biografia traça.
O rigor da matéria e o seu conhecimento enciclopédico tecem a proliferação controlada por onde o universo transborda e nos é contado.
Os seus corpos estão quentes da febre do dia, os seus olhos largamos no tempo que não passa. Essas crianças não entendem as fórmulas, não percebem as alusões, mas é elas que, antes de mais, o contador de histórias se dirige. Está pronto a adivinhar os seus frémitos, a pele arrepiada, o risco que protege. A sua voz vem de além dos Mares, repleta de sobresaltos desses países da África cuja ausência é presença; demora-se na noite, que acolhe no seu ventre as crianças trémulas.
Fico estupefacto quando pretendem reduzir
Há lá demasiadas praias de evidência, aqui e ali atravancadas de raízes, quando a língua se espessa em nodosidades.
A evidência declamada é imediatamente transparência tautológica.
O erro que tantas vezes se comete com o poeta é acreditar que o seu texto preenche, define o palco de um teatro.
se articula em movimentos subterrâneos
Não há archotes em torno dessa palavra; apenas a mão estendida para o horizonte que desponta, onda ou planalto.
É o infinito sempre possível. A ronda da voz desmultiplica-se no mundo.
não mergulha no susurro das trevas, onde se adivinharia o mundo em redor; ela saúda as auroras, quando os ecos longínquos se misturam já aos ruídos familiares e a caravana deixa o deserto, ligeira.
não reúne a memória despedaçada de um lugar, onde um outro lugar perdido se furta ainda ou por fim se revela.
envolve em ecos as vagas desses países de antes e recusa a sonolência da palavra transparente, dá a pensar o país real, este país de aqui, de que fala.
começa por “festejar uma infância”
recusa o conforto do álbum que se folheia. O que é de facto essa memória sempre em fuga? Qual é esse lugar (essa casa), de que apenas é dito que dela se sai? E essa solidão altiva entre “todas as coisas” brilhantes, explodidas, irreparavelmente reluzentes?
Essa oralidade não convoca os ouvintes para limiares da sombra, lança-nos a todos na resolução de um porvir.
não é memória torturada que se repete em sombras, mas a hesitação que anuncia as partidas solenes.
sabe que perdeu para sempre aquilo que nunca esquecerá, e que abandona
uma revolução da técnica do cantochão
a sua natureza primeira. E o cantochão, que geralmente é pretexto de um arroubo, de uma evasão, coloca-se aqui visivelmente em pleno mundo.
recusa das histórias de povos, mas a sua magnificiência como assunção da História
Esta errância não é a do rizoma; está bem enraizada: num querer e numa Ideia.
A História ou a sua negação, a intuição do Uno, eis os polos magnéticos do pensamento do Ocidente
assentou o seu nome.
Acreditou que a condição de liberdade é a de não se ser nem governado por uma história, a não ser a que generaliza, nem limitado por um lugar, se este não fo espiritual.
O perpétuo “partir” permite colecionar rochas, urdir a materialidade
itinerários, igualmente sumptuosos, em sentidos opostos, se anulam
traça sempre para nós, mas petrificadas na sua generosa renúncia, as figuras das nossas solidões a partilhar.